quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A ACESSIBILIDADE PARA O PPDs


EDITORIAL CORREIO DO POVO, 07/12/2011


Nesta semana, de 4 a 10 de dezembro, está sendo levada a público a Semana Nacional de Acessibilidade e Valorização da Pessoa com Deficiência. Um dos temas mais importantes em discussão diz respeito à acessibilidade desse contingente, que hoje está em torno de 45 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. Um dos principais temas do debate é como garantir que essas pessoas possam exercer sua prerrogativa de ir e vir com dignidade.

Uma breve avaliação do que foi conquistado até hoje foi apresentada pelo secretário nacional de Promoção da Pessoa com Deficiência da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Antônio José Ferreira. Para ele, houve avanços, mas ainda resta muito terreno para ser palmilhado. Como exemplo, lembrou o programa do governo com foco na habitação, o Minha Casa, Minha Vida 2, que projetou suas unidades com acessibilidade interna e espaço suficiente para a circulação de cadeirantes, favorecendo a inclusão social dessas pessoas no seu lugar de moradia e nas suas comunidades.

Um outro programa do governo federal contempla o público das pessoas com deficiência. Trata-se do Viver sem Limite, que tem na sua estrutura uma interação de outros projetos de cunho social e inclusivo. Ele deverá receber um aporte de recursos na ordem de R$ 7,6 bilhões, com ênfase em atividades de saúde e educação. Dentro dessas diretrizes, estão sendo providenciados 2,6 mil ônibus adaptados, além da contratação de professores de linguagem dos sinais.

Como não poderia deixar de ser, a qualificação profissional é outra meta, com a abertura de 150 mil vagas e 45 novos postos de habilitação para atendimento especial. Tudo isso, somado ao desafio de inclusão por ocasião da realização da Copa do Mundo, faz com que esse público-alvo se sinta mais respeitado em seus direitos. O combate ao preconceito deve ser uma luta permanente, com o engajamento da sociedade.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

DESCARTE DO IDOSO

Compulsória: descarte do idoso. Antonio Pessoa Cardoso. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia - JUS NAVEGANDI, 08/2011.


A aposentadoria compulsória é medida preconceituosa, pois a aposentadoria deve ser um prêmio pela dedicação do profissional ao trabalho e não punição por ter chegado a 70 anos.

O sistema de aposentadoria do servidor público sofreu varias Emendas desde a promulgação da Constituição de 1988: A Emenda Constitucional nº. 20, de 16/12/1998, a nº 41 de 31/12/2003 e a Emenda n. 47, de 6/7/2005. Nenhuma delas, entretanto, criou regras de transição para a aposentadoria compulsória, no sentido de preservar direito preexistente dos servidores no exercício do cargo. Essas alterações constitucionais mostram a instabilidade do governo no tratamento dessa matéria de tamanha importância para os servidores públicos.

A primeira reforma, de 1998, fixou idade mínima e privilegiou o tempo de contribuição para aposentadoria, estabelecendo a idade em 60, (sessenta anos), se homem, e 55, cinqüenta e cinco, se mulher, impedindo o afastamento precoce do trabalho, como acontecia antes, desligamento do trabalho até com 40, (quarenta), anos.

A Emenda nº. 41 não inovou, no que se refere à idade e tempo de contribuição, mas mudou, quando deixou de considerar o último salário em atividade como fator de cálculo para a aposentadoria, buscando a média de salários de contribuições para fixação do benefício. Ainda trouxe um fator previdenciário que reduz o salário do servidor que se aposentar antes de completar a idade de 60, (sessenta), anos, para homem, ou 55 (cinquenta e cinco), para mulher.

A Emenda nº. 47 restabeleceu a paridade plena para todos aqueles que entraram no serviço público até 16/12/1998. Retroagiram seus efeitos à Emenda nº. 41/03 para evitar maiores danos aos servidores que se aposentariam com observância do que foi preceituado na Emenda do ano de 2003.

Na aposentadoria compulsória, estabelecida desde a Constituição de 1946, nada mudou, porque mantido o descarte do profissional que completa 70, (setenta), anos, sem maiores indagações.

Todavia, desde o ano de 2005, quando se aprovou a última Emenda no sistema previdenciário, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Emenda Constitucional n. 457/2005, que "altera o art. 40 da Constituição Federal, relativo ao limite de idade para a aposentadoria compulsória do servidor público em geral". Alteração, Constituição Federal (1988), Administração Pública, aposentadoria compulsória, servidor público civil, regulamentação, lei complementar, aumento, limite de idade, Disposições Constitucionais Transitórias, aposentadoria, magistrado, membros, Judiciário, Ministros, (STF), Tribunais Superiores, (TCU).

Nesses seis anos, houve debates, discussões, a matéria foi ao Senado e voltou à Câmara dos Deputados onde aguarda inclusão em pauta para votação.

A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), que reúne 37 sindicatos e quase um milhão de servidores, posicionou pela aprovação da fixação da idade compulsória em 75, (setenta e cinco), anos; a Associação Nacional de Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência – AMPID – manifestou no mesmo sentido; a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, FIESP, diz que "um servidor público que se aposenta aos 70 anos é a expressão burra de um país que se dá ao luxo de mandar para a cesta do lixo boa parcela de sua sabedoria e experiência". A entidade calcula que a economia para o Tesouro, se elevada a aposentadoria para 75, (setenta e cinco), anos, seria de R$ 1.4 milhão por ano, chegando a R$ 5.6 bilhões em cinco anos. Muitas outras entidades tem-se posicionado pelo aumento da idade.

As Associações de Magistrados prosseguem pugnando pela rejeição, apesar de ultimamente ter diminuído movimentações nesse sentido. Apresentam argumentos para atender a interesses pessoais de progressão na carreira, sem comentário algum sobre a extensão da medida a quase 10 milhões de servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Assim, uns pugnam para ficar como está, ou seja, aposentadoria aos 70 anos, na forma do art. art. 40, inc. II da Constituição, que institui a aposentadoria compulsória; outros lutam para alteração do dispositivo, aumentando a idade da aposentadoria para 75 anos.

O posicionamento contrário tem sido restrito ao nível dos juízes de primeira instância que alardeiam a necessidade de "oxigenação", mesmo argumento usado pelos advogados e promotores para acesso aos tribunais, com o chamado quinto constitucional; falam em renovação de jurisprudência, como se isso só acontecesse com os novos magistrados e os mais idosos não tivessem a sensibilidade e inteligência para modificarem entendimento com prevalência de nova jurisprudência. Isso, aliás, acontece com freqüência nos tribunais; insinuam o apego ao poder, em prejuízo para ascensão na carreira dos mais novos. Maior é o poder conferido aos membros do Legislativo e do Executivo e esse perigo não ocorre.

Os que defendem o aumento da idade para a compulsória sustentam-se na estabilidade financeira da previdência que contaria com maior período de recolhimento da contribuição previdenciária, aliado a um tempo menor de gozo dos benefícios dos funcionários públicos que preferirem deixar o serviço público; anotam ainda a economia que geraria com a desnecessidade de contratação de outro servidor para substituir o aposentado. Alicerçam seus argumentos na elevação da idade média de expectativa de vida do brasileiro que passou de 39 anos, na década de quarenta, quando foi criada a aposentadoria compulsória, para mais de 72, (setenta e dois), anos na atualidade.

Penetrando mais nos princípios constitucionais, depara-se com o valor social do trabalho, art. 1º, IV e na liberdade do livre exercício, art. 5º, XIII da Constituição. Se há liberdade constitucional de livre exercício do trabalho, como impedir o cidadão com 70, (setenta), anos de idade para continuar trabalhando, se tem disposição e condições? É o que ocorre com o servidor público, respingando somente em um dos três Poderes da República, o Judiciário; no Executivo e no Legislativo não existe essa proibição, na forma dos requisitos enumerados no art. 14, § 3º da Constituição. Há para o Executivo e para o Legislativo exigência apenas de idade mínima.

O art. 87 da Constituição limita o mínimo de idade para ser Ministro de Estado, mas não fixa idade máxima, admitindo, portanto, a nomeação de ministros para brasileiros com mais de 70, (setenta), anos de idade. Por outro lado, o art. 230 garante a dignidade e bem estar dos idosos, além de participação na comunidade. O art. 170 valoriza o trabalho humano.

A aposentadoria compulsória viola todos esses dispositivos, porque promove o isolamento do servidor público da comunidade, além de impedir o trabalho de quem está em condições e na atividade por mais de trinta, quarenta anos.

Ademais, há incoerência, colisão mesmo, entre o art. 40, § 1º, inc. II, aposentadoria compulsória, e o § 19 desse mesmo dispositivo, que trata do abono de permanência para o servidor público que deixa de exercer seu direito de aposentadoria voluntária. Não se justifica a criação de prêmio para quem não aposenta após satisfazer as exigências da lei e ao mesmo tempo o castigo de impedir o exercício do trabalho, porque completou a idade, proibitiva de continuar em atividade. A Constituição não explica o motivo dessa restrição de trabalho para o septuagenário, possibilitando a interpretação de incapacidade ou compulsória destinar-se à renovação dos quadros.

Na verdade, vários dispositivos da Constituição desmentem essa conclusão de incapaz, arts. 87, 170, 230 e outros; a renovação não constitui argumento para descartar o profissional que continua em condições de trabalho, mesmo porque a lei permite a contratação para cargo de confiança de profissional com mais de 70, (setenta), anos.

Ademais, como entender assim, idoso com mais de 70, (setenta), anos ser incapaz, se permite o exercício de cidadãos com idade superior nos cargos mais importantes da República?

Se adentrarmos para a legislação ordinária, Lei n. 10.741/2003, posterior à Constituição, encontraremos dispositivos que não condizem com o descarte do trabalho somente pela idade. O art. 3º do Estatuto do Idoso diz ser obrigação do Poder Público "assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho..." Adiante, art. 26, garante direito do idoso à atividade profissional e o artigo seguinte veda a discriminação e a fixação de limite máximo de idade para admissão do idoso em qualquer trabalho ou emprego. No parágrafo desse artigo 27, fixa como critério para desempate, em concurso público, a maior idade.

No âmbito do Pode Público e do Judiciário especificamente, as modificações introduzidas pela informática, a exemplo da justiça sem papel, da videoconferência, do julgamento virtual, proporcionam melhores condições de trabalho sem o empenho físico de tempos atrás.

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, por ocasião da aposentadoria compulsória do Ministro Neri da Silveira falou sobre o tema:

"A propósito, por que profissionais da iniciativa privada não são obrigados a se aposentar com 70 (setenta) anos; Por que servidores públicos ocupantes de cargos comissionados (que têm natureza de direção, assessoramento e chefia) podem continuar trabalhando depois dos 70 (setenta) anos e servidores efetivos não; Seriam os servidores públicos efetivos menos aptos (mental e fisicamente) para exercer função pública após os 70 (setenta) anos do que os titulares de mandato eletivo (presidentes, governadores, prefeitos, senadores, deputados e vereadores) que exercem os mais altos cargos da República? Sinceramente, para todos esses questionamentos não encontrei resposta legítima no ordenamento jurídico que autorizasse a discriminação, a quebra da isonomia".

Hoje, os cargos públicos estão sendo ocupados, a cada tempo que passa, por servidores muito jovens, de forma que a permanência no cargo tende a aumentar, não resolvendo assim a movimentação na carreira, buscada pelos magistrados.

O estudo promovido pela Associação dos Magistrados de que o período médio de permanência de desembargadores e ministros nos tribunais superiores varia de quinze a dezoito anos vai aumentar, pois o Judiciário recebia a bem pouco tempo magistrados com idade de 24, (vinte e quatro), anos, e só recentemente aumentou para 27, (vinte e sete), anos; essa é a conclusão que se tira da idade da graduação em direito, mais os três anos de experiência; assim, a grande maioria chegará aos tribunais com a idade média de 50 anos, possibilitando sua permanência por vinte anos mesmo com a manutenção de 70 anos; com o aumento para 75, (setenta e cinco), anos poderá esse fenômeno ocorrer apenas nos primeiros anos de implantação.

O Estado não pode desistir do trabalho de profissionais experientes, simplesmente para atender à progressão de carreira de jovens; ao invés disso, com prejuízo para a sociedade, cuide o Congresso Nacional de aprovar a Emenda Constitucional nº. 61/1999, que fixa a idade mínima de trinta e cinco anos e o período mínimo de dez anos de efetivo exercício de advocacia como requisitos para ingresso na carreira. Considere-se para isso os altos índices de reprovação nos concursos da magistratura, em torno de 2% e a média nacional de cargos vagos em torno de 20%.

Nos Estados Unidos, de maneira geral, o magistrado deve ter um mínimo de quarenta anos para ingresso na magistratura.

Os juízes federais americanos permanecem na atividade judicante, enquanto desejarem; na esfera estadual há muita variedade e tem estados que fixa a idade para aposentadoria compulsória em 75 anos.

Wesley Brown começou na advocacia em 1933, nomeado por John Kennedy, juiz federal; aos 103 anos continua no Tribunal de Wichita, Estado do Kansas, e diz que "cumprir este serviço público lhe dá uma razão para viver"; Ruth Bader Ginsburg, com 78 anos, continua como juíza do Tribunal de Justiça de Washington.

O profissional não permanece na atividade profissional somente pelo salário que recebe, mas um elenco de condições permite a continuidade. Aqueles que não mais sentem condições de oferecer aquilo que entendem possível podem deixar o cargo com a aposentadoria voluntária.

Enfim, a aposentadoria compulsória deve ser respeitada, enquanto não modificado o texto constitucional, mas não deixa de ser medida cheia de preceito discriminatório e preconceituoso; afinal, a aposentadoria é um prêmio pela dedicação do profissional ao trabalho e não punição por ter chegado a 70, (setenta), anos.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O IDOSO PRECISA DE MAIS ATENÇÃO

Vítor Bley Moraes - ZERO HORA 06/10/2011

O Dia Internacional do Idoso, comemorado no dia 1º de outubro, foi uma data de pouca repercussão, como tem sido todos os anos. Talvez, porque há muito pouco a festejar. Se, por um lado, as pesquisas mostram que os brasileiros estão vivendo mais e que, em alguns países, como o Japão, a população centenária já é bem expressiva, aqui no Brasil os nossos velhos são muito maltratados pelas políticas públicas e pela própria sociedade. A longevidade não é correspondida com a qualidade de vida que os idosos deveriam ter, a começar pelo salário minguado pago aos aposentados da Previdência Social, que muitas vezes não cobre sequer os custos com os medicamentos. E é com o avanço da idade que surgem doenças de tratamentos caros e, muitas vezes, de pouca eficácia, como o temível mal de Alzheimer. É nessa faixa que são necessários cuidadores, ainda raros e caros. O idoso também não dispõe de hospitais especializados em doenças peculiares da terceira idade. O atendimento na rede pública de saúde é precário. Os idosos enfrentam filas nos postos de saúde, na busca por medicamentos gratuitos e disputam vagas para leitos nas emergências superlotadas.

Na verdade, o Brasil não está preparado para o envelhecimento da população. Os velhos são tratados como um estorvo, um produto descartável, que não produz mais. Não há políticas públicas eficientes. Inexistem programas de inclusão e o Estatuto do Idoso é pouco respeitado. No dia a dia, é comum ver os assentos reservados a idosos, gestantes e portadores de deficiência física ocupados por jovens em ótimo estado de saúde. O mesmo acontece nas filas dos bancos, dos supermercados, ou ainda nas vagas de estacionamento. A falta de sensibilidade, de respeito às leis, de humanidade é brutal. E o pior de tudo é que, muitas vezes, o problema já começa em casa, com a família. Os idosos são maltratados, explorados ou abandonados em abrigos sem as mínimas condições. Um contraste com os países desenvolvidos, onde seus velhos são venerados por representarem conhecimento, experiência de vida.

O mais triste é que, apesar dos avanços da ciência, que proporcionam maior longevidade, muito cedo uma pessoa é considerada velha no Brasil. No mercado de trabalho, por exemplo, trabalhador com mais de 40 anos, com raras exceções, já é tratado como veterano e é preterido pelos mais jovens. A recolocação é mais difícil. Ironicamente, a cada nova pesquisa sobre o aumento da expectativa de vida, é necessário aumentar o período de contribuição ao INSS para a aposentadoria. Mas, ao contrário do serviço público, no qual a aposentadoria é integral, o contribuinte da Previdência Social passa por uma fórmula de cálculo cujo valor fica longe do que recebia quando estava trabalhando e muito mais distante ainda das suas necessidades básicas. Por isso, poucos são os idosos deste país que têm condições de festejar alguma coisa, seja no Dia Internacional do Idoso, seja em qualquer dia do ano. É preciso mais atenção com os idosos.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

IDOSOS SEM A DEVIDA ATENÇÃO

EDITORIAL CORREIO DO POVO, PORTO ALEGRE, TERÇA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2011

O Brasil é um país que está com um contingente cada vez maior de idosos, envelhecendo rapidamente. A previsão é de que, em 2050, teremos 22,5% da população com mais de 65 anos. Hoje, esse percentual é de cerca de 10%, com um montante de 20 milhões de brasileiros com idade entre 60 e 64 anos. No último sábado, registrou-se o Dia do Idoso, uma data estabelecida com o intuito de chamar a atenção para os problemas dos que se encontram nessa faixa etária. Também nesse dia se registraram oito anos da aprovação da lei 10.741/03, o chamado Estatuto do Idoso.

O incremento no total de pessoas da denominada terceira idade coloca desafios para os governantes e para a sociedade. Novos parâmetros devem ser adotados a fim de enfrentar com eficiência questões peculiares para um segmento de idade mais avançada. Aí se incluem pontos referentes à acessibilidade, asilos e convívio familiar, além da necessidade de ganhar uma renda compatível com uma fase da vida que demanda muitos gastos com saúde e remédios.

Um dos itens mais preocupantes diz respeito à falta de uma fiscalização efetiva dos asilos, muitas vezes verdadeiros depósitos de pessoas. Existem poucas instituições dessa natureza com caráter público e as privadas ainda padecem de um maior acompanhamento por parte das autoridades. Também não pode ser negligenciada a importância da estrutura familiar, que pode dar um suporte para que os idosos possam dispor de um cotidiano estabilizador, com foco no afeto e na atenção.

A formulação de políticas públicas capazes de defender os interesses daqueles que já produziram tanto pelo Brasil é uma tarefa que não pode ser considerada menor. Muito já foi feito, mas a realidade mostra que restam ainda muitas coisas para serem equacionadas para que a cidadania dos mais velhos seja exercida em toda a sua plenitude.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

ACESSIBILIDADE HUMANA

MARCELO BORGES RODRIGUES, SÓCIO-DIRETOR DA EGALITÊ RECURSOS HUMANOS ESPECIAIS, INCUBADA NA RAIAR DA PUCRS - ZERO HORA 14/09/2011

As obrigações legais referentes a construções civis têm popularizado o conceito de acessibilidade na sociedade brasileira. Ainda que seja comum confundir acessibilidade arquitetônica com a instalação de rampas, como se apenas as pessoas cadeirantes necessitassem de acessibilidade, sem estender esse direito a pessoas com outros tipos de deficiência, são visíveis os avanços em prédios públicos e alguns outros privados.

Entretanto, esses meios de acesso arquitetônico têm revelado outro problema, a (falta de) acessibilidade humana. As pessoas não estão preparadas para lidar com as pessoas com deficiência (PCD), que aos poucos estão alcançando o seu devido espaço na sociedade. Entendendo acessibilidade humana como o conjunto de comportamentos adequados para prover o acesso de todos a tudo, de modo respeitoso e inclusivo, impressiona a quantidade de pessoas que sequer sabem qual comportamento é o correto. O que é óbvio às PCD é, muitas vezes, novidade para grande parte da população. Complementa essa visão a falta de uma cultura inclusiva no país, pois muitas pessoas ainda não veem as PCD como possíveis colegas de trabalho ou consumidores, relegando-os ao assistencialismo.

Por falta de acessibilidade humana, muitas pessoas, ainda que bem-intencionadas, vêm cometendo uma série de gafes e gerando constrangimentos que seriam evitados por meio de rápidas ações educacionais de introdução ao mundo das PCD. São situações cotidianas: para evitar o constrangimento de dizer que não sabe Libras, o atendente do balcão tenta não “enxergar” a pessoa surda; é a pessoa que grita com um cego achando que dessa maneira ela vai entender melhor. De forma alguma se pretende afirmar que não mais existe preconceito no Brasil. Mas, mesmo entre as pessoas que querem ajudar, preocupa o despreparo da população em lidar com as PCD.

Nos projetos de inclusão que estão sendo construídos país afora, são as ações de educação para a inclusão que têm obtido maior sucesso na empreitada de transformar essa em uma nação culturalmente mais acessível. É crucial dar os meios de acesso arquitetônico, mas, sozinhos, eles serão insuficientes para transformar-nos em um país acessível a todos; rampas não implicam atendimento adequado às PCD. Precisamos desde já construir políticas para o desenvolvimento da acessibilidade humana no país, e o caminho é o da educação para a inclusão.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

VAMOS SEGUIR ESTA IDEIA!

CLAUDIO SILVA, DIRETOR-PRESIDENTE DA FADERS - ZERO HORA 02/09/2011

O ano de 2011 é de inegável importância para as pessoas com deficiência. É o da comemoração dos 30 anos do Ano Internacional da Pessoa com Deficiência e os 20 anos da lei de cotas. Mas são muito grandes ainda os desafios a serem superados para que esta parcela da população possa ter uma vida digna e com qualidade. E a Faders tem o compromisso de buscar a garantia desses direitos, articulando ações em todos os espaços de governo e ainda ouvindo a sociedade civil. De acordo com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, discriminação por motivo de deficiência significa qualquer diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, com o propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o desfrute ou o exercício, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais nos âmbitos político, econômico, social, cultural, civil ou qualquer outro.

Adaptação razoável significa modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.

Com estas argumentações, o conjunto de medidas lançadas pelo governo do Estado é produto de um amplo diálogo na instância governamental e, principalmente, com as próprias pessoas com deficiência, que devem ser sujeitos de sua própria história.

A Central de Tradutores e Intérpretes de Libras será um espaço que concentrará tradutores e intérpretes de Libras para dar conta da demanda crescente no RS da comunidade surda. Irá garantir, através de contratação de profissionais habilitados, intérpretes em todos os eventos promovidos pelo governo do Estado e ainda suprir demanda de demais poderes. Esta medida facilitará a vida de quase 400 mil pessoas que têm deficiência auditiva no RS. O Programa de Acessibilidade Comunicacional viabilizará a compra e edição de material bibliográfico disponibilizado em formato acessível, facilitando a vida de mais de 800 mil gaúchos e gaúchas que têm deficiência visual ou dificuldade de enxergar.

Já o Comitê Gestor Estadual de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência será o espaço de articulação do governo de forma transversal para analisar e pensar as estratégias de aplicabilidade da Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência no âmbito do RS, envolvendo 11 secretarias de Estado, Coepede, SRT, Famurs e MP-RS.

A regionalização da Campanha Nacional de Acessibilidade tem um símbolo extraordinário. O RS está sendo o primeiro Estado do país a promover a descentralização da campanha com o lema: Acessibilidade: siga essa ideia, tchê. Nosso Estado tem mais de 1,5 milhão de gaúchos e gaúchas que possuem algum tipo de deficiência que exigem dos poderes constituídos atitudes concretas.

Segundo Ruy Barbosa, a regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Para o jurista, tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Assim, temos convicção de que as ações são modestas frente às históricas demandas deste segmento, mas, ao mesmo tempo, demonstram um novo olhar sobre esta política de forma responsável, transparente e inovadora! Convocamos todos os gaúchos e gaúchas, para que possamos, em todos os momentos de nossa vida, seguir juntos essa ideia!

terça-feira, 23 de agosto de 2011

ELES ESTÃO SENDO BARRADOS


Preconceito. Cães-guia em treinamento são barrados em locais públicos de SP - 23/08/2011 às 10h18m; Bom Dia Brasil - O GLOBO

SÃO PAULO - Cães-guia em treinamento estão sendo barrados em locais públicos de São Paulo. O projeto, que vai beneficiar dezenas de deficientes visuais, está enfrentando preconceito na maior cidade do país. Voluntários que precisam levar filhotes de cães-guia para todos os lugares são barrados. Um direito que é garantido por lei, mas parece que ainda não saiu do papel.

O projeto foi lançado pela Prefeitura a dois meses. Este ano, 32 cães-guias devem ser treinados por voluntários. Os animais acompanham os treinadores-voluntários para que se acostumem a locais públicos. A meta, até 2012, é chegar a cem animais treinados por ano.

Eu tive alguns problemas em transporte público, como metrô e ônibus

- Eu saio, venho trabalhar, depois vou dar aula e ela vai comigo, fica do meu lado, não incomoda ninguém. Almoça, janta, vai ao cinema ou ao shopping, tudo comigo. É a extensão do meu braço esquerdo - diz o assessor técnico Luciano Bellocchi, que está treinando Europe, um filhote de labrador.

Dentro de dois anos, Europe vai ser cão-guia de cegos. Ela é um dos 19 labradores que já estão convivendo com os voluntários do programa do Serviço Social da Indústria (Sesi).

Nesta etapa, o filhote precisa se familiarizar com os diversos tipos de ambiente. No escritório, Frontier faz sucesso, brinca com os funcionários e está aprendendo a respeitar o espaço. Para que ele se torne um bom guia, essa convivência é muito importante.

Os cães-guia começam a ser preparados ainda filhotes para serem os olhos de quem não enxerga. A primeira parte do treinamento é feita por pessoas comuns, que socializam os cães.

- Mas eu tive alguns problemas em transporte público, como metrô e ônibus - afirma Luciano Bellocchi.

- No primeiro fim de semana, ele já enfrentou um problema no metrô. Eu cheguei para entrar com ele e os seguranças bloquearam a entrada. Quase depois de duas horas eles autorizaram, desde que dois seguranças acompanhassem o trajeto - contou o publicitário Gabriel Simonati.

- É uma novidade. Os empregados estão acostumados com cães adultos. A gente corrigiu e reforçou essa orientação para todo o quadro de empregados, seja de segurança ou de estação. Essa informação foi repassada para todo mundo - esclareceu Cecília Guedes, chefe do departamento de relações com clientes do Metrô de São Paulo.

- Nós temos uma lei municipal, estadual e federal, e as três garantem o livre acesso do cão tanto guia com o cego, como o filhote em socialização junto com a família em locais públicos - explica Romi Barreto, gerente de saúde do Sesi-SP.

A esperança é que, com uma maior divulgação do projeto, os cachorros possam circular livremente pela cidade. O difícil vai ser se despedir dos labradores. Os voluntários apenas socializam o cão e depois o entregam.

- Eu sei que vai doer bastante o coração, mas como é para um bem maior, é uma dor temporária. Eu sei que ela vai ser muito mais útil para outra pessoa do que para mim - diz Luciano Bellocchi.

- É um mega companheiro em todos os lugares, o tempo todo, 24 horas por dia. Com certeza vai ser difícil largar - reconhece o publicitário Gabriel Simonati.


sexta-feira, 22 de julho de 2011

O RIO PODE DAR O EXEMPLO. O BRASIL TAMBÉM

O RIO PODE DAR O EXEMPLO - TERESA COSTA D'AMARAL, O GLOBO, 21/07/2011 às 17h33m

O Congresso aprovou, há vinte anos, a reserva de vagas para o emprego de pessoas com deficiência. A Lei 8213, de 24 de julho de 1991, determinava que empresas com mais de 100 empregados devem ter de 2% a 5% de seus cargos preenchidos por pessoas reabilitadas pela Previdência ou por pessoas com deficiência. Em dezembro de 1999, há 12 anos, o artigo foi regulamentado. Até hoje a lei não é cumprida.

Certamente existem empresas que obedecem à cota, e o Ministério do Trabalho deveria divulgar seus nomes, para que fossem exemplos multiplicadores. A grande maioria não cumpre a lei. Existirão leis de segunda categoria? Feitas para não serem cumpridas? Será esse o caso dessa e de outras leis voltadas para pessoas com deficiência?

A empresa que não paga tributos em dia corre alto risco e um risco totalmente diferente se não cumprir a cota de empregados com deficiência. O preconceito dificulta às pessoas com deficiência no Brasil competirem por um bom emprego e mostrarem sua competência. A sociedade tem uma atitude sutilmente disfarçada sobre as pessoas com deficiência: em assuntos sociais - se dedica à diversidade, mas o quesito deficiência ela prefere deixar longe.

Nem mesmo Franklin Roosevelt, quatro vezes eleito presidente dos Estados Unidos, permitiu que sua deficiência tocasse sua imagem pública de competência. Esse é o padrão que precisamos romper, é essa ameaça que precisa deixar de ser ameaça.

O Estado (Ministério do Trabalho e Emprego e Ministério Público do Trabalho) deveria atuar conjuntamente. Agindo isoladamente, cria um vácuo. Exemplo? Apoiar atletas com deficiência em vez de empregá-los. Outro exemplo? Empregar deficientes apenas pelo tempo suficiente para ir à fiscalização. Mais outro? Preparar-se para pagar uma multa de milhões de reais e a cobrança chegar na casa dos mil. Ainda outro: empresas de terceirização com grandes contratos em estatais não cumprem a cota. Esse não deveria ser um pressuposto para entrar no processo de licitação, ao lado de outros que demonstram a regularidade da empresa? Segundo dados da Rais, em 2009 só 21,4 % das vagas determinadas pela cota eram respeitadas e apenas 289 mil pessoas com deficiência estavam empregadas!

Proponho celebrarmos os 20 anos da lei fazendo um mutirão para tornar o Rio exemplar no cumprimento da cota. Vamos juntos, ONGs, empresas, Ministério do Trabalho e Ministério Público do Trabalho, para alcançar o cumprimento da Lei de Cotas nos próximos anos. Vamos cobrar do Estado brasileiro providências. Vinte anos teriam sido suficientes para que as empresas brasileiras cumprissem o artigo 93 da Lei 8213. Lei é feita para ser cumprida. Ou não precisa?

TERESA COSTA D'AMARAL é presidente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD).

quarta-feira, 6 de julho de 2011

DESCASO TIRA MILHÕES DA SOLIDARIEDADE

Milhões à espera de solidariedade. Desde a criação de lei para incentivar projetos sociais, R$ 156 milhões oferecidos na forma de renúncia fiscal não foram usados - MAICON BOCK, ZERO HORA 06/07/2011

Criada para incentivar a realização de projetos sociais, a Lei da Solidariedade poderia estar ajudando mais gaúchos. Dos R$ 196 milhões oferecidos em sete anos pelo governo do Estado na forma de renúncia do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), apenas R$ 40 milhões foram efetivamente empregados pelas empresas.

Acada ano, o governo oferece às companhias gaúchas renúncia de ICMS de até R$ 28 milhões para que patrocinem projetos com foco em crianças, adolescentes, idosos e ambiente, por exemplo. O montante investido na área social pode chegar a R$ 37 milhões por ano, devido à contrapartida prevista às empresas participantes (25% do valor repassado ao projeto via renúncia fiscal).

Desde 2004, quando as empresas começaram a se utilizar das vantagens da lei, a participação é inferior ao esperado ano após ano. Nos três primeiros anos, foram investidos R$ 6,2 milhões em ações sociais, sendo que 72% dos recursos foram destinados a apenas três projetos. O dinheiro ficou concentrado em somente 17 municípios gaúchos.

– As empresas têm conhecimento da lei, mas acho que ainda falta convencimento da importância de participar. Não faltam projetos, mas empresas dispostas a financiá-los – avalia o coordenador do Programa de Apoio à Inclusão e Promoção Social (Lei da Solidariedade).

O pico de captação ocorreu em 2010, quando foram atingidos R$ 10 milhões. A criação da Rede Parceria Social, em 2007, contribuiu para mudar o panorama inicial. Com o surgimento do mecanismo que organiza e facilita o contato entre empresas e entidades sociais de diferentes regiões, os recursos passaram a ser melhor distribuídos. No ano passado, 310 projetos foram contemplados.

Se com R$ 40 milhões foi possível apoiar 850 projetos e beneficiar mais de 90 mil pessoas, com os R$ 156 milhões que voltaram aos cofres públicos os números poderiam ser melhores.

Neste ano, R$ 10 milhões estão garantidos para 250 projetos, segundo a Secretaria Estadual do Trabalho e do Desenvolvimento Social. O montante ainda possível de captação é de R$ 18 milhões.

Além do incentivo direto às entidades sociais, levantamento feito pela Fundação de Economia e Estatística apontou que 19,6% do montante oferecido por meio da Lei da Solidariedade retornou em impostos ao Estado.

Uma das empresas que mais contribuíram com projetos sociais por meio da lei é a Randon, de Caxias do Sul. Serão R$ 400 mil neste ano. Por meio do Instituto Elisabetha Randon, as empresas do grupo ajudam 14 organizações não governamentais (ONGs) que oferecem atividades como reforço escolar e oficinas em várias regiões do Estado.

– Atualmente, repassamos recursos para uma ONG de Alegrete. Se não fosse a rede, possivelmente não conheceríamos esse projeto – explica Maurien Barbosa, diretora-presidente do Instituto Elisabetha Randon.

Tire suas dúvidas

1) O que é a Lei da Solidariedade? - Oficialmente chamada de Programa de Apoio à Inclusão e Promoção Social (Paips), a Lei da Solidariedade consiste em incentivo fiscal para a realização de projetos sociais. Instituída pela lei 11.853/2002 e alterada pela lei 12.761/07 e regulamentada pelos decretos 42.338 e 42.339/2003, ela possibilita uma parceria entre governo, entidades sociais e empresas.

2) Como funciona? - A empresa interessada em financiar um projeto elaborado e executado por entidades sociais pode deduzir do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviço (ICMS) que teriam de recolher até 75% do valor a ser repassado ao projeto. Outros 25% devem sair de recursos próprios da empresa. A abrangência é estadual, em um compartilhamento de responsabilidades entre Estado, municípios, Conselho de Assistência Social (estadual e municipais), Conselho dos Direitos da Criança e Adolescente (estadual e municipais), entidades sociais, empresas e sociedade civil.

3) Por que é importante? - O benefício fiscal concedido pela Lei da Solidariedade permite ao governo acelerar e garantir a aplicação de recursos na assistência social na medida em que o repasse do dinheiro por parte da empresa é feito diretamente à entidade executora do projeto social.

4) Quais projetos poderão ser financiados pelo programa? - Projetos da área de assistência social voltados a qualificar, incentivar e melhorar os serviços assistenciais buscando a elevação do padrão da qualidade de vida da população que apresenta vulnerabilidade social, e ainda projetos na área de segurança alimentar, como restaurantes populares.

5) Qual é a duração do benefício fiscal? - A duração é definida no momento da adesão ao programa, isto é, a partir do comprometimento da empresa com o financiamento parcial ou total do projeto.

6) Sou responsável por uma entidade. Como faço para participar? - Cadastre-se no Programa de Apoio à Inclusão e Promoção Social para apresentar projetos em sua área de atuação, podendo neste momento apresentar o financiador. Outra possibilidade é apresentar o projeto, aprová-lo e depois buscar apoio de empresas para executar o projeto.

7) Quais as exigências para entidades? - A entidade social deve ter inscrição no Conselho Municipal de Assistência Social e/ou no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, ter registro de Utilidade Pública na Secretaria do Trabalho e do Desenvolvimento Social e regularidade no INSS e na Fazenda Estadual.

8) Sou empresário. Como posso participar? - É preciso se cadastrar na Secretaria Estadual do Trabalho e do Desenvolvimento Social (STDS) para financiar projetos de assistência social avaliados por uma câmara técnica e aprovados pelo Conselho Estadual de Assistência Social. A empresa poderá financiar qualquer projeto, em áreas específicas, ou entrar no processo com a instituição/entidade executora com projetos definidos previamente. Quem participa pode usar o selo Compromisso pela Inclusão em seus materiais de divulgação.

9) Quais as exigências para empresas? - É preciso estar regular com obrigações trabalhistas e com Fazenda Estadual e apresentar balanço social do ano anterior, conforme o disposto em lei de 2000.

10) É possível participar de mais de um projeto? - Sim, desde que a empresa tenha crédito e atenda aos requisitos exigidos em lei.

11) Posso escolher o público-alvo do projeto? - Sim, é possível definir se o projeto a ser apoiado contemple públicos como criança, adolescente, adulto, idoso, pessoas com deficiência, índios, migrantes. É preciso deixar isso expresso no momento da adesão.

12) Onde posso obter mais informações? - Pessoalmente no Centro Administrativo Fernando Ferrari (Av. Borges de Medeiros, 1.501, 8° andar, Porto Alegre), pelo e-mail paips@stds.rs.gov.br, pelo site www.stds.rs.gov.br ou pelo telefone (51) 3288-6529, das 8h30min às 12h e das 13h30min às 18h.

INDICADORES

- R$ 196 milhões é o montante que poderia ter sido utilizado desde a criação da lei(a aplicação começou em 2004);

- R$ 40 milhões é o valor efetivamente empregado em projetos sociais desde o início da lei;

- 850 projetos sociais foram contemplados com recursos desde 2003;

- 90 mil pessoas foram beneficiadas com recursos disponibilizados pela lei só nos últimos três anos;

- R$ 28 milhões é teto anual da renúncia fiscal oferecida pelo governo do Estado pela Lei da Solidariedade;

- R$ 10 milhões já estão garantidos para projetos sociais em 2011.

domingo, 8 de maio de 2011

AMOR, AFETO E SOLIDARIEDADE

Cláudio Brito - ZERO HORA 08/05/2011


Dos votos unânimes do Supremo Tribunal Federal reconhecendo as relações homoafetivas como entidades familiares, dois são de extrema significação didática, além, é claro, do que representaram como suportes técnicos e doutrinários para a construção jurídica realizada. Carlos Ayres Britto, o relator, e Celso de Mello, um dos últimos a votar, arrasaram, deram show de erudição e discernimento. Britto foi o condutor de todo o plenário e trouxe os argumentos mais fortes em favor da tese que deu ao tema uma interpretação conforme a Constituição, ainda que, na Carta e no Código Civil, esteja, com todas as letras, apenas a união estável entre homem e mulher como equiparável à família. Ficou muito claro o rumo desenhado por Ayres Britto, quando enfrentou com os princípios fundamentais de nosso maior diploma legal a aparente dificuldade em vencer o texto constitucional. Liberdade, direito à não discriminação, igualdade, dignidade e outros valores foram trazidos ao debate e o caminho a percorrer escancarou-se. Os demais reforçaram o esboço. Completou-se a obra com a clareza e o brilho a que estão acostumados os que acompanham o trabalho de Celso de Mello.

“As relações homoafetivas são marcadas pelo amor, afeto e solidariedade”, disse o ministro mais antigo de nossa Corte Suprema. Os fundamentos explícitos ou implícitos na Constituição, que buscou para alinhavar o voto cristalino que produziu, mais que todos os outros, deram ao julgamento o conteú-do de compreensão da realidade que ainda pudesse faltar. É quando se deve lembrar Maria Berenice Dias, a corajosa advogada gaúcha que, no tempo em que era juíza, escreveu sentenças revolucionárias para acolher pretensões de casais de pessoas do mesmo sexo. Foi ela quem cunhou a expressão homoafetividade. Hoje os dicionários consagram o termo, o que foi citado por Ayres Britto. Alguns parágrafos de seu voto fizeram justiça a Berenice. Faço o mesmo e incluo outro desbravador, Roger Raupp Rios, juiz federal gaúcho, na lista dos juristas responsáveis pelo resultado agora alcançado. Remaram em águas revoltas por muitos anos e hoje podem curtir a satisfação de terem apostado em suas lúcidas convicções.

O afeto está reconhecido como a base de tudo.

O afeto como sinônimo ou como expressão do amor.

E a solidariedade completa maravilhosamente o tripé em que se assentam relações que transcendem a sexualidade. Afeto é o carinho que temos por quem amamos, é uma disposição de alma, um sentimento. Amizade e simpatia estão aí, no mesmo rol. Possibilidades de relação humana construtiva, digna, merecedora de acolhimento pelo Direito.

Ninguém pode ser privado de seus direitos ou sofrer qualquer restrição de ordem jurídica devido à sua orientação sexual. Todos têm direito de receber a mesma proteção das leis e do sistema jurídico. Não se pode admitir a reprise do acontecido com um soldado, veterano do Vietnã, que, depois de ser condecorado por atos de heroísmo, foi expulso do exército americano por viver em companhia de outro rapaz. Luís Barroso, advogado que defendeu na tribuna a juridicidade das relações homoafetivas, recordou a frase dramática daquele moço guerreiro: “Deram-me uma medalha por matar dois homens. Expulsaram-me do exército por amar outro homem”.

Recolho de outro ministro, Marco Aurélio, síntese razoável do julgamento histórico: “O Brasil está vencendo a luta desumana contra o preconceito. O Estado existe para auxiliar os indivíduos na realização dos respectivos projetos de vida, não impedir. É obrigação constitucional do Estado reconhecer o direito familiar e a finalidade jurídica das uniões homoafetivas”.

Cabe ao Congresso Nacional sacudir sua inércia e fazer as leis que complementem o que o Supremo inaugurou. Não podem reclamar deputados e senadores pelo avanço que os julgadores praticaram. Declarar o direito dos homoafetivos foi correção de um cenário de preconceito e discriminação, que a falta de algumas normas legais escritas permitia. O tempo se encarregará de consolidar o que ainda pode estar incomodando muita gente. O mesmo desconforto que pessoas conservadoras sentiram há mais de 30 anos, quando a Lei do Divórcio foi aprovada. O Supremo Tribunal Federal cumpriu rigorosamente o que lhe cabia como Corte Constitucional. Não foi outra a conclusão do experiente Gilmar Mendes: “O limbo jurídico contribui para a discriminação. Talvez contribua até para os episódios de violência que vemos. A nossa omissão representaria um agravamento no quadro de desproteção de minorias discriminadas”.

Assim fica bem melhor, em um ambiente de amor, afeto e solidariedade.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

ÍNDIO É GENTE

OPINIÃO - Xico Graziano - O Estado de S.Paulo - 19/04/2011

Hoje é o Dia do Índio. Merecido. A data ajuda a valorizar as origens da sociedade, provoca reflexão sobre o presente. Difícil é descobrir o que guarda o futuro para os remanescentes indígenas. Haverá espaço para eles na sociedade pós-moderna?

Talvez 5 milhões de nativos, ninguém sabe ao certo quantos, viviam no Brasil na época do descobrimento. Distintamente da colonização espanhola na América Central, os portugueses aqui não atuaram para dizimá-los. Longe do confronto, os índios mantiveram espírito colaborativo com os colonizadores.

Eram rudimentares e dispersos os índios brasileiros. Viviam como na Idade da Pedra. Ignoravam a faca e o anzol, nunca haviam visto uma galinha ou um cavalo, comiam mandioca, desconheciam a banana. Não ergueram castelos nem usavam joias. Esse "atraso" histórico os levou ao encantamento com as bugigangas tecnológicas trazidas pelos portugueses.

Sabe-se que as doenças europeias - gripe, sífilis, rubéola - causaram elevada mortandade nos povos originais das Américas. A perda de territórios e a miscigenação também foram causas de decréscimo populacional. Resultado: hoje se contam 460 mil índios nas aldeias, distribuídos entre 225 tribos. As línguas originais, estimadas em 1.300, reduziram-se a 180 dialetos.

Somam 107 milhões de hectares as reservas indígenas brasileiras, distribuídas em 611 territórios, dos quais 98% pertencem à Amazônia. Não é pouco. Tais espaços, protegidos pela Fundação Nacional do Índio (Funai), ultrapassam em 48,6% a área cultivada no País, exceto pastagens. Significa que cada índio, contando crianças e mulheres, domina uma média de 228 hectares. Na agricultura, a área média dos estabelecimentos rurais, segundo o IBGE, soma 68,2 hectares.

Pode parecer muita terra para pouco índio. Mas faz sentido. Além da necessidade de preservação florestal das imensas glebas, tornado viáveis a caça e a pesca artesanal, as reservas indígenas cumprem, simultaneamente, função ambiental relevante, protegendo valiosos ecossistemas naturais. Justificam-se, assim, duplamente.

O núcleo da questão indígena não reside no tamanho da área que eles ocupam. Nem na recente, e controversa, demarcação de novos territórios, que avançam sobre terras agricultadas há décadas, particularmente em Roraima e em Mato Grosso do Sul. O dilema, mais complexo, advém do papel destinado aos remanescentes indígenas na sociedade atual. A dúvida parece ser eterna: é melhor mantê-los distantes, isolados, ou certo seria promover sua integração na sociedade? Tutela ou suicídio étnico?

A prudência indica o caminho do meio. Mas a rota é difícil. Os vetores da modernidade, alimentados pela facilidade da comunicação, atingem em cheio as aldeias indígenas, afetando seus costumes e danificando sua cultura secular. Levam, ao mesmo tempo, qualidade de vida e alcoolismo, televisão e prostituição. Como se opor ao progresso?

Jean-Jacques Rousseau, em seu famoso Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens (1755), provocou uma grande polêmica ao defender o "nobre selvagem". Dizia o filósofo suíço que o "estado de natureza" primitivo era moralmente superior à civilização, pois esta deformava a essência humana. Deu o que falar.

É aristotélica a discussão, que nunca perdeu sua pertinência, sobre o caráter da natureza humana. Agora, sob os imperativos da sociedade tecnológica e globalizada, a pergunta permanece: serão os povos tradicionais naturalmente bons? A pergunta nunca esboçou fácil resposta.

Recentemente estive no México visitando as ruínas das civilizações pré-hispânicas, desde a cidade sagrada de Chichén Itzá, símbolo da civilização maia, até o recém-descoberto Templo Mayor dos astecas e o mistério de Teotihuacán, com suas magníficas pirâmides do Sol e da Lua.

Curtir aquela estranha beleza histórica não suplanta o horror de descobrir que templos, pirâmides e cenotes eram, na verdade, venerados locais de sacrifícios humanos. Princesas se assassinavam barbaramente em rituais religiosos, alimentando o poder macabro daquelas sociedades antigas. Para os astecas, o equilíbrio cósmico só seria mantido se os deuses fossem alimentados com "corações palpitantes". Crueldade pura.

Nós somos levados a ser condescendentes com os povos primitivos, talvez por buscarmos um subterfúgio que esconda as mazelas da sociedade atual. Esse esconderijo mental, ultimamente, inventou que os indígenas seriam "ecológicos". Um conceito idílico, falso.

Os tupiniquins foram grandes incendiários da floresta virgem, utilizando o fogo para abrir roça - a conhecida "coivara" - e encurralar a caça. A devastação da floresta atlântica começou com a aliança entre portugueses e índios. Juntos, com machado afiado, derrubaram todas as árvores de pau-brasil que conheciam.

Questionar a santidade dos antepassados explica parte do sucesso do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, imperdível livro de Leandro Narloch. Ele "joga tomates" na historiografia oficial e contesta o mito do índio como homem puro, vivendo em harmonia com a natureza, ideia comum na cabeça das pessoas, das crianças principalmente.

Nas comemorações do Dia do Índio, a melhor forma de valorizá-los será tratá-los dentro da sua própria vivência, jamais os estereotipando como sublimes representantes da bondade celestial. Há índios perversos, como perversos são aqueles que não os toleram.

Apostar na diversidade étnica e cultural mistura respeito com realismo. As famílias indígenas carecem ter oportunidades, educação, vida saudável, cuidados do Estado. Nada que ver com a tutela que os trata como se incapazes fossem.

Índio é gente, ser humano, não bicho estranho.

Índio é gente
19 de abril de 2011 | 0h 00
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Xico Graziano - O Estado de S.Paulo
Hoje é o Dia do Índio. Merecido. A data ajuda a valorizar as origens da sociedade, provoca reflexão sobre o presente. Difícil é descobrir o que guarda o futuro para os remanescentes indígenas. Haverá espaço para eles na sociedade pós-moderna?

Talvez 5 milhões de nativos, ninguém sabe ao certo quantos, viviam no Brasil na época do descobrimento. Distintamente da colonização espanhola na América Central, os portugueses aqui não atuaram para dizimá-los. Longe do confronto, os índios mantiveram espírito colaborativo com os colonizadores.

Eram rudimentares e dispersos os índios brasileiros. Viviam como na Idade da Pedra. Ignoravam a faca e o anzol, nunca haviam visto uma galinha ou um cavalo, comiam mandioca, desconheciam a banana. Não ergueram castelos nem usavam joias. Esse "atraso" histórico os levou ao encantamento com as bugigangas tecnológicas trazidas pelos portugueses.

Sabe-se que as doenças europeias - gripe, sífilis, rubéola - causaram elevada mortandade nos povos originais das Américas. A perda de territórios e a miscigenação também foram causas de decréscimo populacional. Resultado: hoje se contam 460 mil índios nas aldeias, distribuídos entre 225 tribos. As línguas originais, estimadas em 1.300, reduziram-se a 180 dialetos.

Somam 107 milhões de hectares as reservas indígenas brasileiras, distribuídas em 611 territórios, dos quais 98% pertencem à Amazônia. Não é pouco. Tais espaços, protegidos pela Fundação Nacional do Índio (Funai), ultrapassam em 48,6% a área cultivada no País, exceto pastagens. Significa que cada índio, contando crianças e mulheres, domina uma média de 228 hectares. Na agricultura, a área média dos estabelecimentos rurais, segundo o IBGE, soma 68,2 hectares.

Pode parecer muita terra para pouco índio. Mas faz sentido. Além da necessidade de preservação florestal das imensas glebas, tornado viáveis a caça e a pesca artesanal, as reservas indígenas cumprem, simultaneamente, função ambiental relevante, protegendo valiosos ecossistemas naturais. Justificam-se, assim, duplamente.

O núcleo da questão indígena não reside no tamanho da área que eles ocupam. Nem na recente, e controversa, demarcação de novos territórios, que avançam sobre terras agricultadas há décadas, particularmente em Roraima e em Mato Grosso do Sul. O dilema, mais complexo, advém do papel destinado aos remanescentes indígenas na sociedade atual. A dúvida parece ser eterna: é melhor mantê-los distantes, isolados, ou certo seria promover sua integração na sociedade? Tutela ou suicídio étnico?

A prudência indica o caminho do meio. Mas a rota é difícil. Os vetores da modernidade, alimentados pela facilidade da comunicação, atingem em cheio as aldeias indígenas, afetando seus costumes e danificando sua cultura secular. Levam, ao mesmo tempo, qualidade de vida e alcoolismo, televisão e prostituição. Como se opor ao progresso?

Jean-Jacques Rousseau, em seu famoso Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens (1755), provocou uma grande polêmica ao defender o "nobre selvagem". Dizia o filósofo suíço que o "estado de natureza" primitivo era moralmente superior à civilização, pois esta deformava a essência humana. Deu o que falar.

É aristotélica a discussão, que nunca perdeu sua pertinência, sobre o caráter da natureza humana. Agora, sob os imperativos da sociedade tecnológica e globalizada, a pergunta permanece: serão os povos tradicionais naturalmente bons? A pergunta nunca esboçou fácil resposta.

Recentemente estive no México visitando as ruínas das civilizações pré-hispânicas, desde a cidade sagrada de Chichén Itzá, símbolo da civilização maia, até o recém-descoberto Templo Mayor dos astecas e o mistério de Teotihuacán, com suas magníficas pirâmides do Sol e da Lua.

Curtir aquela estranha beleza histórica não suplanta o horror de descobrir que templos, pirâmides e cenotes eram, na verdade, venerados locais de sacrifícios humanos. Princesas se assassinavam barbaramente em rituais religiosos, alimentando o poder macabro daquelas sociedades antigas. Para os astecas, o equilíbrio cósmico só seria mantido se os deuses fossem alimentados com "corações palpitantes". Crueldade pura.

Nós somos levados a ser condescendentes com os povos primitivos, talvez por buscarmos um subterfúgio que esconda as mazelas da sociedade atual. Esse esconderijo mental, ultimamente, inventou que os indígenas seriam "ecológicos". Um conceito idílico, falso.

Os tupiniquins foram grandes incendiários da floresta virgem, utilizando o fogo para abrir roça - a conhecida "coivara" - e encurralar a caça. A devastação da floresta atlântica começou com a aliança entre portugueses e índios. Juntos, com machado afiado, derrubaram todas as árvores de pau-brasil que conheciam.

Questionar a santidade dos antepassados explica parte do sucesso do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, imperdível livro de Leandro Narloch. Ele "joga tomates" na historiografia oficial e contesta o mito do índio como homem puro, vivendo em harmonia com a natureza, ideia comum na cabeça das pessoas, das crianças principalmente.

Nas comemorações do Dia do Índio, a melhor forma de valorizá-los será tratá-los dentro da sua própria vivência, jamais os estereotipando como sublimes representantes da bondade celestial. Há índios perversos, como perversos são aqueles que não os toleram.

Apostar na diversidade étnica e cultural mistura respeito com realismo. As famílias indígenas carecem ter oportunidades, educação, vida saudável, cuidados do Estado. Nada que ver com a tutela que os trata como se incapazes fossem.

Índio é gente, ser humano, não bicho estranho.

XICO GRAZIANO, AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO.
E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR

terça-feira, 19 de abril de 2011

DIREITOS RESPEITADOS

A educação inclusiva diz respeito a um conceito amplo que compreende o acesso, a participação e a aprendizagem de todos os estudantes. Esta perspectiva rompe com o modelo homogêneo de organização do ambiente escolar, implicando mudança das práticas pedagógicas e de gestão para promover respostas às necessidades específicas dos estudantes. O direito a um sistema educacional inclusivo é assegurado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), que estabelece o compromisso com a adoção de medidas de apoio necessárias no âmbito da educação regular. Assim, a inclusão escolar deixa de ser uma possibilidade para tornar-se um direito dos estudantes com deficiência, garantindo acesso a recursos e serviços específicos em ambientes que maximizem seu potencial acadêmico e social.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) define a educação especial como modalidade transversal aos níveis de ensino, responsável pelo Atendimento Educacional Especializado (AEE), complementar à formação dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. O decreto 6.571/2008 estabelece, no âmbito do Fundeb, o financiamento à dupla matrícula desses estudantes, na educação regular e no AEE. A política de acessibilidade se expande no país com: implantação de mais de 24 mil salas de recursos multifuncionais para o AEE, em 83% dos municípios; apoio à acessibilidade arquitetônica; formação continuada de professores; disponibilização de livros em formatos acessíveis e laptops aos estudantes cegos; a criação do curso de Pedagogia Bilíngue - Libra/Língua Portuguesa no Instituto Nacional de Surdos e a Graduação em Letras/Libras; modernização do parque gráfico do Instituto Benjamin Constant; apoio aos núcleos de acessibilidade nas instituições de ensino superior; e a realização do Exame Nacional de Certificação para o Ensino e a Tradução/Interpretação de Libras. Destaca-se, ainda, o acompanhamento do acesso e permanência na escola dos estudantes com deficiência, com ações intersetoriais de identificação e eliminação de barreiras, ampliando o acesso à escola de 21% (2007) para 53% (2010).

A educação especial passa a integrar o projeto político pedagógico das escolas regulares, disponibilizando apoio específico a estudantes e orientação às estratégias pedagógicas e de acessibilidades em sala de aula. A realidade educacional se altera com avanços em todas as etapas e modalidades da educação básica e superior. De 2002 a 2010, a inclusão escolar passa de 110.704 (25%) matrículas para 484.332 (69%) e o número de escolas inclusivas cresce de 17.164 (8%) para 85.090 (44%). O Brasil não ignora o direito que as pessoas com deficiência alcançaram com a Convenção (ONU/2006) e a conquista desta geração, que define a deficiência como parte da diversidade humana e não mais aceita a segregação. O eixo estruturante da inclusão constrói valores humanos que não reforçam fronteiras entre "iguais" e "diferentes" e traduzem a concepção emancipatória da valorização das diferenças. Nosso compromisso como gestores e educadores é construir políticas públicas que representem a caminhada da educação inclusiva, superando os atos de benevolência e investindo na qualificação da escola pública.

CLAUDIA PEREIRA DUTRA é secretária de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC). O GLOBO, 18/04/2011

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Só acho que deveriam preparar a direção, capacitar mais os professores e adequar os Estabelecimentos de Ensino para a inclusão e acessibilidade. As políticas não saem do papel e nem funcionam sem agentes administradores e executores capacitados e comprometidos.

domingo, 17 de abril de 2011

CIDADÃO INTIMIDADO SE CALA


SEQUELAS PERMANENTES. Um cidadão que se calou - RICARDO STEFANELLI - ZERO HORA 17/04/2011

Atingido com uma barra de ferro há um ano ao advertir um motorista de que ele estacionara em uma vaga para deficiente, Léo Mainardi afirma que as suas sequelas não são apenas físicas. As dores e as cirurgias a que precisou ser submetido também o desmotivaram a exigir o cumprimento das leis e das regras de convivência. Enfim, o cidadão se calou.

Um ano depois de se insurgir contra o que considerou um caso de falta de civilidade no trânsito, o comerciante Léo Mainardi, 50 anos, sofre todos os dias as dolorosas consequências de seu ato. Atingido na cabeça por um motorista a quem chamara a atenção por ter estacionado em uma vaga reservada a deficientes, em um supermercado da Capital, ele continua limitado 12 meses depois pelas sequelas daquela tarde. E, pior, as consequências não são apenas físicas. Antes empenhado, no dia a dia, em promover e estimular a conscientização no trânsito, ele confessa que agora, amedrontado, fecha os olhos para as barbaridades de todo dia.

O episódio que mudou a vida de Mainardi ocorreu em 18 de abril passado, no estacionamento do supermercado Makro, no bairro Anchieta. Pai de uma cadeirante de 26 anos, deficiente desde o nascimento, o morador de Novo Hamburgo revoltou-se ao ver o comerciante Rudicir Fernandes de Freitas, 34 anos, ocupar indevidamente uma vaga de estacionamento reservada a pessoas com dificuldade de locomoção. Na briga que se seguiu, após agressões verbais, Mainardi levou uma pancada na cabeça, o que o deixou com um coágulo e forçou a realização de cirurgias:

– Eu disse que a vaga era para deficientes e que analfabetismo não é deficiência. Não coloquei da melhor maneira. Poderia ter dito de outra maneira – avalia hoje.

O comerciante ficou mais de dois meses afastado do trabalho e deve se submeter em breve a uma nova cirurgia. A entrevista destas páginas não tem o objetivo de retornar ao fato, hoje nas mãos da Justiça e de advogados. Ao ler as declarações de Mainairdi, o leitor vai perceber que o tema, aqui, é a cidadania – ou melhor, a costumeira falta dela, em especial nas ruas e rodovias do país. Na conversa, o agredido relata que, por causa das perfurações no crânio, teve de mudar tudo em sua vida para evitar o risco de batidas na cabeça, que podem ser fatais.

O caso deu origem a um inquérito policial, que levou o Ministério Público a denunciar Freitas por lesão corporal grave. A primeira audiência foi marcada para setembro.

– Fiquei aflito com a espera, mas vi um caso como o do Eliseu Santos, que está fechando um ano e só agora estão começando a ouvir as testemunhas. Ou seja, é demorado mesmo – resigna-se Mainardi.

Zero Hora procurou Rudicir de Freitas, mas ele preferiu não comentar o assunto.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - ESTA É MAIS UMA PROVA DO DESCRÉDITO NA JUSTIÇA REVELADA NA SUA MOROSIDADE EM JULGAR AS ILICITUDES E NAS PENAS BRANDAS QUE SENTENCIA.

quarta-feira, 30 de março de 2011

SEM COMPARTILHAMENTO

ESPECIALISTA CRITICA POLÍTICA DO MEC. Para professora, alunos não compartilham a língua nas escolas convencionais - 29/03/2011 às 23h49m. O Globo


RIO - A diretora de Políticas Educacionais e coordenadora de Ensino de Libras na Universidade Federal de Santa Catarina, Patrícia Luiza Ferreira Rezende, disse, em e-mail ao GLOBO, que é contra a forma como o Ministério da Educação executa a política de educação especial no país. "Infelizmente, a Lei da Libras, o decreto e a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência não têm sido cumpridos a contento pelo MEC. A atual política de inclusão insiste em colocar crianças surdas junto com as ouvintes, sem haver um compartilhamento linguístico entre elas. Nesses espaços, as crianças surdas oriundas de famílias ouvintes não adquirem sua língua natural de forma espontânea, como as crianças ouvintes que compartilham a mesma língua da sua família interagindo e obtendo informações e, assim, construindo o conhecimento de mundo, que é aprofundado na escola. Como haver inclusão se não há aquisição linguística pela criança surda?"

Em seguida, a professora, que é surda-muda, explica como o portador de surdez encara o aprendizado do português: "A língua de instrução utilizada em todos os espaços da escola inclusiva é o português. No máximo, os alunos contam com a presença de intérpretes de língua de sinais durante as aulas, o que muitas vezes torna inviável o ensino, já que a criança surda nem sequer domina Libras, muito menos possui conhecimento prévio do mundo por meio de língua nenhuma. Mas a metodologia de ensino continua sendo a mesma para surdos e ouvintes. O português é ensinado como primeira língua aos surdos, descumprindo a legislação."

POLÍTICA E INCLUSÃO

Políticas de inclusão de surdos em escolas convencionais. Patrícia Rezende, pedagoga, o globo, 29/03/2011

Infelizmente, a Lei da Libras, o decreto e a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com deficiência não têm sido cumpridos a contento pelo Mec. A atual política de inclusão insiste em colocar crianças surdas junto com as ouvintes sem haver um compartilhamento linguístico entre elas. Porque nesses espaços as crianças surdas oriundas de familia ouvintes não adquirem sua língua natural de forma espontânea como as crianças ouvintes que compartilham a mesma língua da sua familia interagindo e obtendo informações e assim construindo o conhecimento de mundo que é aprofundado na escola. Como ter inclusão se não há aquisição linguística pela criança surda?

A língua de instrução utilizada em todos os espaços escolares da escola inclusiva é o português. No máximo, os alunos contam com a presença de intérpretes de língua de sinais durante as aulas, o que muitas vezes torna inviável o ensino já que a criança surda nem sequer domina Libras e muito menos possui conhecimento prévio de mundo por meio de língua nenhuma. Mas a metodologia de ensino continua sendo a mesma para surdos e ouvintes. O português é ensinado como primeira língua aos surdos descumprindo a legislação. O próprio Mec se contradiz ao apoiar uma lei que prevê ensino de português para surdos como segunda lei, mas na prática o fazer como ensino de primeira língua.

Além disso, muitas vezes a criança surda é a única na sala, permancendo isolada de seus colegas ouvintes. Mesmo que a escola ofereça curso de Libras às crianças ouvintes, elas não interagem na sua totalidade com as crianças surdas. E os surdos deixam de ter estímulos linguísticos em Libras o que traria o desenvolvimento na etapa de alfabetização adequado. Percebemos o fracasso da escola inclusiva nitidamente ao avaliar o desenvolvimento dos surdos. Temos duas pesquisas, uma feita pela USP e outra pela UFSC que provam esse fracasso. Segundo a pesquisa de mestrado da professora Mariana Campos, da UFsCar, 50% dos alunos de uma escola inclusiva se sentem tristes e frustrados por não encontrarem artefatos da cultura surda na escola.

O discurso do Mec acusa as escolas de surdos de serem segregacionistas. Isso é uma falácia. Cada vez mais, ganha força a tese de que a segregação é promovida pelas políticas educacionais que reconhecem diferentes línguas e culturas. O argumento é plausível, pois recorre à ideia de que, se queremos unir as pessoas, devemos colocá-las juntas e não separadas. Apesar de ser aparentemente aceitável, essa concepção de inclusão rejeita as diferenças culturais dos surdos e as especificidades linguísticas. Existe o imaginário de que basta colocar um intérprete na sala de aula, uma muleta para o aluno surdo, e estaremos promovendo a inclusão e o bilinguísmo. A maioria dos pesquisadores da área defende que reunir surdos em uma mesma escola ou sala de aula não significa separá-los do mundo ou torná-los mais dependentes. Ao contrário, os ambientes linguísticos que favorecem a vivência de uma língua de maneira espontânea fazem com que os sujeitos se tornem mais autônomos, pois eles alcançam o conhecimento de maneira mais rápida e eficaz. A experiência linguística plena faz com que as pessoas se sintam seguras nas interações sociais e na relação com seus pares. Além disso, quanto maior o desenvolvimento linguístico dos sujeitos, maior a capacidade de buscar conhecimento e de utilizá-lo livremente no seu cotidiano. Eles podem, de maneira independente, transitar no mundo e compreendê-lo. Assim, o conhecimento de mundo adquirido pelos surdos por meio uma língua natural, a Libras, seria mais eficiente.

DEFICIENTES VISUAIS E AUDITIVOS TEMEM PERDER ESCOLAS ESPECIAIS

SEM PALAVRAS. Deficientes visuais e auditivos temem possibilidade de perder escolas especiais - 30/03/2011 às 00h05m; Duilo Victor

RIO - A comunidade de deficientes auditivos e visuais no Rio se articula contra a possibilidade de encerramento, até o fim do ano, das aulas de ensino básico para crianças e jovens em duas instituições federais: o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), em Laranjeiras, e o Instituto Benjamin Constant, na Urca. Só no Colégio de Aplicação do Ines, há cerca de 500 alunos, desde o maternal até o 3º ano do ensino médio. Além disso, nos dois últimos anos, com a prática adquirida no local, 80 professores se formaram no instituto em pedagogia com o uso da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Já no Benjamin Constant - fundado há 156 anos, dois antes que o Ines -, cerca de 300 alunos estão matriculados do 1º ao 9º anos do ensino fundamental.

Na internet, há vídeos, manifestos e abaixo-assinados contra o fim do ensino básico nas duas instituições. De acordo com a diretora-geral do Ines, Solange Rocha, a diretora de Políticas Educacionais Especiais do Ministério da Educação, Martinha Claret, veio ao Rio há 12 dias para informar que as atividades do Colégio de Aplicação vão acabar até o fim do ano. A intenção é matricular os alunos portadores de necessidades especiais nas redes estadual e municipal convencionais.

Queremos esclarecer que, para a política de inclusão, o Colégio de Aplicação é fundamental, pois é nele que são formados os professores e elaborado o material pedagógico especializado que vão orientar o ensino em todo o país
- A diretora Martinha foi bem categórica (quanto ao fechamento do Colégio de Aplicação). Mas não estamos em embate com o MEC, e sim em período de negociação. E estamos otimistas. Queremos esclarecer que, para a política de inclusão, o Colégio de Aplicação é fundamental, pois é nele que são formados os professores e elaborado o material pedagógico especializado que vão orientar o ensino em todo o país - diz Solange, que, em maio, levará um parecer oficial ao MEC, com propostas para não fechar o Colégio de Aplicação do Ines.

Diretora: sistema está despreparado

No ano passado, em reportagem publicada na revista da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (Feneis), há uma declaração atribuída a Martinha em que ela explica ser a favor de uma política de inclusão dos alunos com necessidades especiais na rede convencional. Diz também que colégios como o de Aplicação do Ines são segregacionistas: "As pessoas não podem ser agrupadas em escolas para surdos porque são surdas". A diretora do Ines, por sua vez, argumenta que não há contradição entre a política de inclusão e a existência do Colégio de Aplicação.

- Não somos contra a política de inclusão. Mas o sistema de ensino no país se mostra despreparado para lidar inclusive com os (alunos) ouvintes - diz Solange.

O Ministério da Educação negou ao GLOBO haver uma ação oficial em relação ao Ines ou ao Instituto Benjamin Constant. Disse ainda que, enquanto não houver "algum plano sólido para a reformulação (da educação especial), não há informações para passar".

A diretora de Políticas Educacionais da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (Feneis), Patrícia Luiza Rezende, coordenadora do ensino de Libras na Universidade Federal de Santa Catarina, é contra o fechamento do Colégio de Aplicação do Ines. "O discurso do MEC acusa as escolas de surdos de serem segregacionistas", disse a professora, que é surda-muda, em e-mail ao GLOBO. "Isso é uma falácia. A maioria dos pesquisadores da área defende que reunir surdos numa mesma escola ou sala de aula não significa separá-los do mundo ou torná-los mais dependentes. Ao contrário, os ambientes que favorecem a vivência de uma língua de maneira espontânea fazem com que os sujeitos se tornem mais autônomos", concluiu.

O futuro do Instituto Benjamin Constant e do Ines será tema de uma audiência pública amanhã, às 14h, na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). O presidente da Comissão de Portadores de Deficiência Física, Márcio Pacheco (PSC), é a favor da política de inclusão, mas contra o fechamento das escolas:

- Sou a favor da inclusão híbrida, de apoio às escolas municipais e ao funcionamento das unidades especializadas, pois estas são formadoras de professores que poderão atuar depois na rede convencional.

A Secretaria municipal de Educação informou, por meio de nota, que não foi contactada sobre um eventual fechamento do Instituto Nacional de Educação de Surdos e do Instituto Benjamin Constant. O órgão disse ainda que conta com 9.923 alunos portadores de necessidades especiais, sendo 4.508 incluídos em classes regulares. De acordo com a política da secretaria, estudantes com deficiências são incluídos em salas regulares se este for o desejo dos pais. Caso contrário, são encaminhados a salas ou escolas especiais.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A inclusão das pessoas com necessidades especiais é demagógica no Brasil, pois as promessas e boas idéias não são acompanhadas de investimentos nas escolas e nos professores para atender a demanda e o foco da inclusão. O resultado é insatisfação e mais traumas.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

ESPECIAIS E CAPAZES


Especiais e capazes - Manoela Alcântara - Correio Braziliense - 03/01/2011 14:54

Pesquisa aponta que, mesmo com respaldo legal, a contratação de pessoas com deficiência é abaixo do mínimo determinado. Para especialistas, essa realidade é resultado, sobretudo, do preconceito dos recrutadores.

Os passos lentos, a fala embargada e as dificuldades motoras causadas por uma paralisia cerebral não foram suficientes para que Heron Luiz dos Santos, 35 anos, desistisse de entrar no mercado de trabalho. Assim como milhares de brasilienses desempregados, ele sai de casa, no Recanto das Emas, quase diariamente com uma pilha de currículos nas mãos rumo ao Plano Piloto, na esperança de realizar o sonho de trabalhar na área de comunicação e exercer sua paixão: o jornalismo policial. A rotina de bater à porta das empresas já dura quase dois anos. Mesmo depois de ouvir tantos “nãos”, ele se recusa a jogar a toalha.

Heron faz parte de uma triste estatística que contraria as leis de inclusão social do país. Segundo pesquisa do Instituto Ethos e do Ibope Inteligência, divulgada no segundo semestre de 2010, apenas 1,5% dos profissionais das 500 maiores empresas brasileiras é portador de deficiência. Quando o cálculo se refere aos cargos de gerência, a porcentagem é ainda menor: apenas 0,4% dos 13.629 gestores pesquisados. Uma realidade que envolve preconceito e despreparo das empresas contratantes, segundo o sócio-diretor e consultor da Areté Treinamento e Desenvolvimento Profissional, Antônio Carlos Pereira. “Ainda hoje, as pessoas acreditam que incluir deficientes no quadro de empregados significa, também, fazer mudanças estruturais drásticas, gastar muito dinheiro. Isso não é verdade. Nem toda deficiência exige tantas alterações”, diz.

Para ele, esse desconhecimento faz muitas organizações optarem por pagar a multa em vez de contratar. Uma das justificativas dos empresários para não absorver essa mão de obra diferenciada é relacioná-la à falta de qualificação, o que nem sempre é verdade. Existem pessoas com deficiência que investem em qualificação e, ainda sim, não conseguem uma chance para mostrar o que sabem. Heron é formado em jornalismo e já publicou dois livros: O pássaro ferido – contos e poesias e Mário Eugênio: o gogó das sete. Ambos os títulos tiveram suas edições esgotadas.

Heron dos Santos acredita que só não conseguiu arrumar emprego por causa da discriminação. “As pessoas pegam o meu currículo e falam que não têm vaga. Talvez não me chamem pelas minhas dificuldades. Por esse meu jeito de falar, elas acham que eu não tenho capacidade. Mas eu tenho. Só preciso de uma oportunidade”, garante. A chance que Heron e qualquer outra pessoa com alguma limitação na audição, na visão ou física pedem a cada currículo entregue seria também uma oportunidade para as empresas mudarem sua imagem diante do público.

Pesquisa divulgada no início de dezembro passado, pelos institutos Akatu e Ethos, mostram que os consumidores têm preferência por instituições socialmente mais responsáveis e punem as que não se importam com as minorias. Para 80% dos entrevistados, o aspecto que mais conta ponto positivo para a imagem da empresa nesse sentido é a relação de trabalho. Além disso, o desenvolvimento dessa mentalidade e a política inclusiva nas instituições proporcionam a diversidade no ambiente de trabalho. “Quando falamos em contratação de pessoas com alguma deficiência, falamos também de uma mudança cultural. O grande desafio é fazer as organizações perceberem o quanto a variedade é vantajosa”, afirma a sócia-diretora da Rhaiz Soluções em Recursos Humanos, Carmem Cavalcanti.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, a transformação foi nítida depois do convênio firmado com a Associação de Centro de Treinamento de Educação Física Especial (Cetefe) para a inclusão de surdos no mercado de trabalho. Implementado há quase dois anos, o programa já viabilizou a contratação de 120 pessoas. Elas desenvolvem um bom trabalho e vão além. “Depois do ingresso deles, nossa interação melhorou. As pessoas têm boa vontade de ajudar e de realizar funções em grupo. O primeiro objetivo foi a inclusão, mas a presença deles no ambiente de trabalho trouxe muito mais que isso”, afirma o coordenador de registro e processos recursais do STJ, Francisco Coutinho.

Força de vontade

Da mesma forma como acontece para qualquer pessoa que pleiteia uma vaga em alguma empresa privada ou algum órgão público, ter uma formação específica também é exigência fundamental para as pessoas com deficiência. As cotas não devem ser entendidas como protecionismo. Elas exigem pré-requisitos como conhecimento e interesse. E preenchê-los não é tarefa simples. Além do preconceito, existe também a insegurança e a baixa autoestima desses candidatos. “Historicamente, eles foram deixados à margem da sociedade. Passaram por um processo de proteção dos pais, com dificuldade de ter a própria independência. Mas o que os deficientes precisam saber é que todas as pessoas têm limitações. Por isso, os pontos positivos devem ser trabalhados para ficar acima das dificuldades", explica Carmen Cavalcanti.

Segundo o presidente do Instituto Cultural, Educacional e Profissionalizante de Pessoas com Deficiência no Brasil (Icep Brasil), Sueid Miranda, uma alternativa para se profissionalizar é procurar associações ou entidades representativas das pessoas com necessidades especiais. Elas oferecem ajuda psicológica e formação. Além disso, têm contatos no mercado e parcerias voltadas para a promoção da inclusão. “No Icep, por exemplo, firmamos um convênio com os que desejam empregar os deficientes e os capacitamos para aquela vaga específica”, explica.

Com o lema “O Trabalho é o Melhor Processo de Inclusão Social”, a entidade encaminhou ao mercado 941 pessoas e empregou 470 só em 2009. No levantamento parcial de 2010, feito antes do encerramento do ano, 483 deficientes já estavam com a carteira assinada. “Eles são sempre elogiados, chegam no horário e têm um bom-humor que contagia toda a equipe. Quem os emprega não se arrepende”, conta Sueid Miranda.

A contratação, porém, exige força de vontade. Para ingressar em uma carreira é preciso ir além do contentamento com algum benefício oferecido pelo Estado. Atualmente, as pessoas com mais chances de admissão são aquelas com deficiências físicas, auditivas e de visão. Os que mais sofrem são os cadeirantes, pelas dificuldades de acessibilidade, e os que têm deficiências múltiplas.

Construção civil

O Distrito Federal conta hoje com uma considerável oferta de trabalho para as pessoas com deficiência. E os candidatos, desde que tenham os diferenciais exigidos pelo mercado, podem procurar as vagas com as quais se identificam e competir por elas. Só no setor da construção civil , há mais de 120 oportunidades para contratação imediata. Para preencher o sistema de cotas , o Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon-DF), em parceria com o Senai e a Coordenadoria para Inclusão de Pessoas com Deficiência (Corde), está qualificando trabalhadores para que atendam as exigências para atuar no setor.

As primeiras turmas dos cursos de auxiliar de eletricista e auxiliar administrativo estão previstas para janeiro. Em abril, devem ser lançados novas opções de formação. As aulas são gratuitas e estão dividas entre a sala de aula e os canteiros de obras. Após a conclusão, a pessoa com deficiência assina contrato de experiência com empresas do setor. Os interessados podem buscar mais informações no site www.sinduscondf.org.br ou pelo telefone 3234-8310, ramal 225.

Há ainda muitas oportunidades para as áreas de telemarketing e para digitador. A tendência é que sejam ofertadas para essas pessoas vagas para o trabalho com as redes sociais, como Orkut, Facebook e Twitter, cada dia mais comuns na estratégia de divulgação das organizações.

Dicas preciosas - Conheça algumas sugestões para tentar uma chance no mercado de trabalho

» Participe de todos os processos seletivos interessantes e que estejam de acordo com o seu perfil, independentemente de ser destinado a PCDs ou não.

» Faça parte das associações que representam os interesses das pessoas de necessidades especiais.

» Invista em estudos e cursos de formação.

» Comunique-se com profissionais com necessidades especiais por meio de redes sociais.

» Procure associações credenciadas que já tenham contato no mercado de trabalho. Elas fazem, entre outras coisas, um trabalho de qualificação e de recuperação da autoestima.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Na realidade, não é só o preconceito dos recrutadores que atrapalha a inclusão, mas a falta de capacitação dos assistentes que deviam monitorar, acompanhar e assistir estes trabalhadores especiais, e dos gestores que trabalham na supervisão, dada às características, necessidades e estado físico e emocional de cada um. Eu passei por um problema deste na Empresa Zaffari Bourbon de Porto Alegre onde os recrutadores foram ótimos, mas a gestão e a assistência foram falhas, ignorantes e preconceituosas.